Interferência humana nos habitats é principal ameaça a espécies de fauna e flora nos biomas Pampa e Mata Atlântica
Embora altere 480 itens do Código Estadual do Meio Ambiente (Cema), o novo código proposto pelo governo Eduardo Leite (PSDB) mantém a Lista de Espécies Ameaçadas de Extinção – a chamada Lista Vermelha – como um “instrumento da Política Estadual do Meio Ambiente”. Além de ser um dos principais instrumentos do licenciamento, a lista é um indicador do desempenho da política ambiental no Rio Grande do Sul. Essa listagem indica que a degradação da natureza aumentou no Estado nas últimas décadas – situação que, segundo especialistas, pode se agravar se a nova legislação for aprovada como está.
Até hoje, foram publicadas apenas duas listas no Estado (o que, avaliam os especialistas, já demonstra a negligência com o monitoramento ambiental): uma em 2002 e outra em 2014. Nesse intervalo, os dados mostram que o número de espécies vegetais ameaçadas de extinção subiu 33%, totalizando atualmente 804 espécies com risco de desaparecerem do território gaúcho. Quanto à fauna, os animais ameaçados aumentaram 7,3%, contabilizando 280 espécies que podem deixar de existir.
A partir das informações levantadas pelas Listas Vermelhas, é possível pensar sobre alguns aspectos da legislação ambiental, analisando se o projeto do novo código prevê as medidas necessárias para a proteção do meio ambiente. Por exemplo, quais as consequências da proposta do governo que desconsidera área de preservação permanente os manguezais, banhados e dunas? Qual o risco para as espécies ameaçadas e a qualidade de vida dos gaúchos?
“Hoje, a principal causa de extinção de espécies é a degradação ou perda dos habitats, principalmente através da extensão da ocupação humana. A gente perde áreas silvestres para a agricultura, mineração, infraestrutura urbana etc”, aponta o professor do Departamento de Ecologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), biólogo Demétrio Guadagnin.
O professor aponta que, depois da perda de habitat, os três fatores que mais contribuem para o desaparecimento de espécies são: em segundo lugar, a introdução de espécies exóticas; em terceiro, o uso excessivo e insustentável dos recursos naturais; e a contaminação do ambiente”. A ordem desses fatores coincide com os estágios de ocupação humana.
“Quando o ser humano chega em um lugar, a primeira coisa que faz é transformá-lo (através do desflorestamento), causando perda e fragmentação dos habitats. Depois, introduz as suas espécies domésticas, invasoras, exóticas (como o gado, caprinos, soja etc.). Em seguida, à medida que a população aumenta, a exploração dos recursos naturais costuma crescer de maneira insustentável. Finalmente, os níveis de contaminação do meio ambiente se elevam”, comparou o Guadagnin.
Aliás, quanto à poluição do ambiente (quarto fator que mais ameaça plantas e animais), o Rio Grande do Sul foi o sexto estado que mais poluiu a atmosfera em 2018, sendo responsável por 4,7% do total de emissões de poluentes no Brasil. O levantamento é do Observatório do Clima, que divulgou nesta semana o relatório de 2019 sobre a emissão de Gases do Efeito Estufa (GEE).
Ao detalhar de onde vieram as 92,6 milhões de toneladas de GEE emitidas pelo Estado, o estudo mostra que é justamente a atividade humana sobre os ambientes silvestres – de maneira insustentável – que gera a maior quantidade de poluição: 52,92% das emissões de GEE tiveram origem na agropecuária; 23,41% no setor de energia; 18,03% nos desmatamentos e queimadas; 5,09% nos resíduos; e 0,5% nos processos industriais.
O professor avalia que “o projeto do novo código flexibiliza a ocupação dos espaços, o que vai resultar na perda e fragmentação dos habitats, principal fator de extinção de espécie”. E arremata: “a proposta também faz uma confusão sobre o que são as espécies nativas, exóticas e silvestres – o que vai acabar incentivando a introdução de espécies exóticas”.
Estudo sobre animais e plantas ameaçados está desatualizado
Apesar da importância da lista de espécies ameaçadas de extinção, até hoje, foram publicados apenas dois estudos sobre os animais e plantas que correm o risco de desaparecerem do território gaúcho – um em 2003 e outro em 2014. A última lista deveria ter sido atualizada em 2018, conforme previsto no decreto do então governador Tarso Genro (PT, 2011-2014) que publicou a lista. Conforme a assessoria da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura, o Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema) deve debater o tema em dezembro. A pasta fez uma consulta pública pelo site para colher sugestões sobre a realização da lista. Os estudos devem iniciar em 2020.
Fonte: Jornal do Comércio